O plano de Deus para a humanidade passa pela decisão de Maria: pelo seu “sim” à missão de gestar o Filho de Deus; por sua decisão de assumir o papel de mãe, que forma Jesus e o edifica na fé; por, em sua humanidade, nos mostrar a postura cristã que nos aproxima da realização do projeto divino em cada um de nós. Maria é o modelo de humildade, de conversão e de seguimento a Jesus.
A FÉ DA JOVEM DE NAZARÉ
Para revelar e realizar a Encarnação de seu Filho, Deus não escolheu o templo ou uma família sacerdotal, Ele elegeu uma jovem de Nazaré, uma aldeã de nome comum, desconhecida e insignificante aos olhos dos grandes daquela época.
A primeira revelação feita pelo anjo foi que ela era “Cheia de Graça” (kecharitoméne, que significa “totalmente transformada pela benevolência divina”). Maria fica admirada e surpresa, não só pelo anjo, mas pelo que ouve dele. Diante da anunciação, por mais inédita, inesperada e fora de comum que fosse a circunstância, Maria não duvida do poder do Espírito Santo, nem do plano de Deus.
Com seu “sim”, que vem de sua coragem, fé e liberdade, Maria deixa uma vida simples e doméstica para assumir a desafiante missão de ser mãe de Jesus, um cidadão público, questionado, imprevisível e audacioso; deixa sua vida previsível, comum e segura para assumir uma vida cheia de contratempos e surpresas; deixa uma vida de família, cotidiana e oculta para assumir uma vida pública cheia de conflitos e lutas.
A partir de sua disposição em viver o plano de Deus, Maria conviveu com a profecia de que “o filho seria sinal de contradição” (Lc 2,34) e de que “uma espada transpassaria sua alma” (Lc 2,35). Ela foi mãe de um condenado, assassinado e abandonado até por quem o seguiu.
Assumiu uma vida que não foi comum, mas que também não foi de privilégios. Escolheu participar e viver inteiramente a caminhada única e original de seu Filho. Tanto é que, nas sete vezes em que aparece no Evangelho, Maria sempre está agindo por causa e em função de Jesus, ela não aparece de forma idealizada, mas como mulher simples, pobre e do povo.
MARIA, A ESCOLHIDA DO SENHOR
Apesar de se falar muito sobre sua virgindade e sua santidade, esses não foram os diferenciais de Maria, afinal, tanto a virgindade quanto a pureza de coração eram posturas das solteiras de família daquela época. Certamente, um de seus méritos para ser a escolhida foi a capacidade de sustentar o seu “sim” a Deus até o fim de seus dias.
Que pessoa sustentaria a ideia de ver seu filho ser humilhado e ainda assim, ser uma mulher da graça e da felicidade? De ter um filho para ser de todos, menos para ser dela?
Somente uma mulher realmente humilde, de verdadeira fé, certa de sua missão, com autoestima suficientemente grande e sábia de seu valor, é capaz de não “choramingar” a presença do filho quando ele se ausentava para doar a estranhos e até a perseguidores. Um modelo de verdadeiro amor, que cuida e educa sem possuir, reter ou controlar.
A segurança e a ousadia de Jesus também não eram apenas divinas, mas fruto da educação recebida de Maria, uma mulher forte e decidida. Uma mulher que saiu a pé, grávida e andou sozinha 120km até a casa de Isabel.
Jesus sabia que sua mãe era uma grande mulher. Ele aprendeu a admirá-la e, a partir de Maria, aceitou se curvar diante de outras mulheres, tanto para atendê-las em seus pedidos quanto para resgatá-las das injustiças e pecados.
A HUMANA MÃE DE DEUS
Ao longo dos séculos, temos colocado sobre a figura de Maria uma infinidade de adornos e nos acostumamos a olhar para eles ao invés de centrar-nos em sua simplicidade e pureza originais.
A verdade é que Maria não necessita de mantos luxuosos. A grandiosidade de sua vida está em seu exemplo, que revela o divino que habita nela e em nós. Em um ser humano, descobrimos algo mais profundo, Maria tem coração puro, limpo, sem mancha, imaculado. Um verdadeiro tesouro escondido que não é um privilégio só dela, mas de cada ser humano.
O próprio São Paulo afirma que “em Cristo Jesus, Deus nos elegeu, antes da criação do mundo, para sermos santos e imaculados, diante dele, no amor” (Ef 1,4). Essa eleição é para todos, sem exceção. Não é uma possibilidade, mas uma realidade que nos faz ser.
Maria é grande porque descobriu e viveu o divino que fez nela sua morada. Ela se descobriu como um ser fundado em Deus e expandiu sua vida a partir dessa realidade. Ela alcançou tal plenitude não porque Deus lhe tenha cumulado de privilégios, mas porque ela se permitiu descobrir o Deus que a habita.
Se a veneramos e nela nos inspiramos para viver o seguimento do seu Filho Jesus, também podemos descobrir e viver o que ela descobriu e viveu, apesar da vida cheia de luzes e sombras, de esperanças e desencantos.
O extraordinário de Maria foi sua fidelidade e disponibilidade, sua capacidade de entrega. Devemos nos alegrar que um ser humano possa nos ensinar o caminho da plenitude, do divino.
Inspirados em Maria, é preciso encontrar, em nós mesmos, esse lugar por onde entra a vida, esse lugar por onde entra o divino, esse lugar por onde entra o amor. É uma experiência de silêncio, uma experiência de esvaziamento, de despir os mantos luxuosos para encontrar em nós a originalidade mais profunda e divina que nos habita. Um caminho, para isso, é seguir Jesus com o mesmo amor e profundidade em que Maria seguiu.