

Ao longo da História do Brasil, não foram poucos os escândalos envolvendo recursos públicos. Quem ama a leitura e acompanha a profusão de estudos sobre o histórico brasileiro de corrupção político-administrativa sabe como as coisas tendem a acontecer por aqui. A geração atual deparou-se com o mensalão, um esquema de desvio de recursos públicos para fins privados, comandado de dentro das mais altas esferas do Governo.
É interessante prestar atenção ao que ocorre com esse tipo de escândalo nos diferentes povos e culturas políticas. Hoje, em alguns países, administradores surpreendidos em casos de uso privado de dinheiro público preferem tirar a própria vida a enfrentar o vexatório processo de julgamento. A condenação seria a suprema ignomínia pessoal. O que chama atenção, porém, é o fato de que a renúncia à vida se dá apenas quando o malfeito é descoberto. Enquanto isso não ocorre, continuam com suas ações lesivas à coletividade. Por aqui, não se tem notícia de semelhante atitude radical. Os corruptos daqui preferem enfrentar os tribunais, aduzindo os mais variados tipos de argumentos para justificar seus malfeitos. Na verdade, em suas práticas, recusam-se a reconhecer a Constituição, como código normativo da vida coletiva a ser respeitada e cumprida por todos. Assim como ela foi feita para proteger os direitos dos cidadãos, também tem a prerrogativa de julgar e punir aqueles que não a cumprem. Foi o artifício encontrado pelas modernas democracias para garantir a igualdade entre todos os membros de uma coletividade. Aqueles que infringem gravemente a Constituição são por ela punidos. O STF deixou claro que ninguém pode se considerar acima da lei.
Os argumentos aduzidos por condenados, seus advogados e defensores merecem particular atenção. Alguns casos revelam quanto de egoísmo está presente o modo de pensar de alguns réus. O desvio de recursos do patrimônio público para a compra de votos e consciências, pagamento de propina, para fins pessoais, partidários ou não públicos, diz a Constituição, é crime. É um dinheiro que faz falta em obras destinadas a melhorar a vida de todos, sobretudo dos menos agraciados pela natureza. Muitos agentes públicos não conseguem perceber que esses recursos, que deveriam beneficiar a todos, fazem falta na segurança, saúde, educação, infraestrutura de portos, aeroportos, estradas, etc. São menos escolas, hospitais, estradas em condições de trânsito seguro, que dificultam as ações de saúde, educação e matam pessoas em suas necessidades mais básicas e em sua dignidade. Basta prestar atenção nos noticiários de todos os dias para indignar-se com tanto pouco caso para com a vida humana.
Ao contrário do passado – quando os cidadãos de bem passavam apenas da indignação ao conformismo impotente – o julgamento do mensalão pelo STF acendeu uma luz nos limites distantes da construção de uma democracia civilizada no Brasil. O cristão não deve entender a punição como uma forma de vingança ou alegrar-se com os castigos impostos aos que desviaram as suas condutas dos caminhos da Constituição. A vingança é anticristã. O castigo previsto em lei tem um caráter educativo. É pedagógico. Tem o objetivo de dizer a todos os cidadãos, que as leis existem para serem respeitadas e cumpridas. Elas têm como fim último ordenar a vida de todos e proteger a integridade de cada membro da comunidade política.
Antônio Frederico Zancanaro
Autor de: A Corrupção Político-Administrativa no Brasil