

Sherry Turkle, professora do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, estuda como as pessoas se relacionam com a tecnologia. Ela aponta que a era digital está criando pessoas com dificuldades de interação social e baixa capacidade de concentração para tarefas mais complexas. “A tecnologia permite que você esteja com quem quiser onde quiser. Você nunca fica sozinho. Mas a capacidade de estar sozinho é crucial para as relações, para as conversas, para a criatividade. O isolamento é o instante em que você se reúne consigo mesmo. Só depois desse momento você pode se encontrar com outra pessoa e repassar o que sabe de si”. Sherry continua: “Por causa dos aparelhos móveis, não falamos mais na mesa do jantar, não prestamos mais atenção em nossos filhos brincando. O smartphone tornou-se uma forma de escapar de momentos chatos, basta se conectar. Mas os momentos ruins fazem parte da vida e nos ajudam a assimilar coisas importantes. Eles nos dão paciência, nos ensinam a lidar com perdas”.
Mergulhar neste mundo cyber-tecnológico tem seu preço e suas conseqüências. É preciso ver o lado positivo e cortar o negativo. Essa matéria é baseada em publicação da Revista Você S/A de março deste ano. O texto, dirigido a profissionais, vale perfeitamente para qualquer pessoa que desempenhe qualquer atividade e que, por necessidade ou não, faça uso da internet, bem como para pais que precisam disciplinar e impor aos filhos limites no uso das novas tecnologias.
EFEITOS DA TECNOLOGIA
Quais são os efeitos da tecnologia na vida cotidiana? Ela nos faz trabalhar demais? Estamos mais distraídos? Nos tornamos pessoas mais superficiais? Nossa ansiedade aumentou? A tecnologia está deixando marcas boas e ruins. Vale a pensar. É consenso que a era digital trouxe avanços indiscutíveis para a forma como trabalhamos e vivemos. Há ganhos significativos de produtividade para profissionais e empresas. “A tecnologia tem um poder tremendo, mudou a forma como o mundo se comunica, mas fez aparecer pessoas com problemas de concentração, pessoas que estão fisicamente em um lugar, mas não estão presentes”, afirma o empresário Soren Gordhamer. Entre avanços, vantagens e conquistas, a tecnologia criou novos problemas profissionais, dentre os quais destacamos:
1) A distração: Estamos disponíveis para receber mensagens e estímulos eletrônicos o tempo inteiro. Um estudo da Universidade da Califórnia mostra que profissionais que trabalham em frente de um computador são interrompidos (ou interrompem-se espontaneamente) a cada três minutos por outras necessidades ou “atrações” acessíveis no próprio computador . Toda vez que isso ocorre leva até 23 minutos para retomar a tarefa. Em uma semana um profissional distraído perde horas de trabalho. Sem contar que o desgaste mental de mudar de uma atividade para outra faz a pessoa ficar muito mais cansada.
2) Ansiedade: A tecnologia tem efeitos sérios sobre a ansiedade. De acordo com Kelly McGonigal, da Universidade de Stanford, o sistema de recompensa do cérebro, o mesmo que nos faz ingerir alimentos para não morrer de fome, se adaptou à era digital e hoje é também carente de informação. A conseqüência é a necessidade de consumir notícias, ou de buscar continuamente por mensagens e postagens nas mídias sociais, como se fosse vontade de jantar. A ansiedade digital levou a Associação de Psiquiatria Americana a incluir a partir deste ano a desordem do uso da internet no Manual de Transtornos Mentais, espécie de lista das doenças psiquiátricas existentes: “Trata-se de um vício, na linha das dependências comportamentais, como comprar ou jogar”.
3) Potencialização de problemas: A tecnologia tem também a capacidade de potencializar problemas que já ocorreriam em qualquer forma, tal como matar trabalho, a chamada cibervadiagem. Um funcionário ou aluno com tendência a deixar as coisas para depois terá essa má conduta exacerbada quando estiver conectado à rede. O mesmo ocorre com pessoas desmotivadas com o que faz ou excessivamente cansadas. Esse comportamento pode ser classificado em dois níveis. No mais brando, a pessoa gasta um tempo escrevendo e-mails particulares que poderiam aguardar o fim do expediente, ou fica vendo notícias de seu clube do coração. Nos casos mais sérios ela esquece do trabalho ou do estudo e fica trocando mensagens instantâneas, jogando ou navegando nas redes sociais. São ações que gastam mais tempo e interferem diretamente na produtividade.
“Essas pessoas vão ter de cumprir o serviço alguma hora, o problema é que elas estão sacrificando também os momentos de praticar atividade física, ler, cuidar da saúde”, diz Christian Barbosa, diretor da Triad PS.
Entre os benefícios da tecnologia, há os que se dizem satisfeitos de poder fazer tudo ao mesmo tempo (multitarefa). No entanto, do ponto de vista cerebral, isso pode ser estressante e comprometer a qualidade do trabalho. Estudos da Universidade Stanford, EUA, mostram que, quanto mais a pessoa se julga eficiente fazendo várias coisas ao mesmo tempo, pior ela as executa. E, quando for necessário se concentrar numa única atividade por longo tempo, a pessoa terá de fazer um esforço maior. “Para nosso cérebro não existe multitarefas”, afirma o psiquiatra Cristiano Nabuco, da USP. “Fazemos bem somente uma coisa por vez. Quando somos multitarefas nos tornamos ineficientes”, diz Rich Fernandes, diretos de RH do Google nos EUA.
4) O problema: Obviamente, um telefone celular ou um software não podem levar a culpa por esse tipo de comportamento. O centro do problema está no uso que se faz de aparelhos e aplicativos. “As pessoas estão se afastando umas das outras, mas isso não é culpa da tecnologia”, diz Rich Fernandez, diretor de RH do Google para os estados Unidos, que compara a tecnologia a um bisturi: pode salvar vidas ou machucar, depende da capacidade do usuário. Para Arthur Bejar, “É preciso saber lidar com o tempo. Qualquer pessoa que esteja criando algo deve se afastar por algumas horas para poder pensar, porque a tecnologia pode distrair”.
VOCÊ NO COMANDO
Maneiras de organizar o uso da tecnologia: É preciso tomar consciência e assumir o controle de sua vida digital. “A tecnologia distrai as pessoas, mas nós é que temos que ter a responsabilidade de decidir o que iremos fazer com ela”, afirma Michelle Gali, ex-diretora do Twitter. A maneira de fazer isso, diz Michelle, não é adotando soluções radicais, como se desconectar ou fugir da tecnologia. É preciso encarar o monstro com disciplina. “Nossa obrigação é aprender a usar a tecnologia e ensinar nossos filhos a se relacionar com ela”.
1) Controle o tempo: Verique mensagens e redes sociais em tempos previamente determinados, no máximo 3 vezes durante o expediente. Isso evita checagens a todo instante, reduz fontes de distração e fica mais fácil manter a concentração.
2) Saia da frente da tela: Saia do escritório. Pode ser lendo livros e revistas ou marcando encontros pessoais em substituição a e-mails ou telefonemas. “A melhor informação aparece nos momentos em que não se está conectado”, diz Gil Giardelli, especialista em redes sociais.
3) Baixe o consumo: Ser popular nas redes sociais e ter os aplicativos da moda cria uma satisfação momentânea, mas pouco contribui com a produtividade. No trabalho, mídias sociais e aplicativos são apenas fontes de distração. Antes de fazer um download, verifique se a ferramenta tem utilidade real ou se é apenas um impulso consumidor.
4) Supere a ansiedade: Resistência é a palavra chave. Não há necessidade de navegar o tempo todo. Desabilite as notificações das redes sociais de seu celular e evite deixá-las abertas enquanto trabalha. O mundo não vai acabar se você se desconectar.
5) Assuma o comando: Use um cronômetro para marcar a duração das atividades. Marque de 20 a 40 minutos para cada tarefa e concentre-se nela. Durante esse momento, você não poderá checar e-mails, redes sociais ou navegar em sites. Ao terminar, faça um intervalo de 5 minutos, alongue-se, dê uma volta no escritório, olhe pela janela, beba água.
6) Faça uma coisa de cada vez: “Para nosso cérebro não há multitarefas”, diz o psiquiatra Cristiano Nabuco, da USP. Quando tentamos fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo, nosso cérebro acaba destinando pouca energia às tarefas. Desligue o celular durante reuniões, fases críticas de trabalho e tarefas que exigem concentração. Faça o mesmo com mensagens instantâneas.
7) Aumentar o cuidado nas interações pessoais: Quando conversar com alguém, feche o seu computador, não fique com o smartphone à mão, priorize o ambiente de conversa. Adam Graff, gerente da Google, diz que na empresa existe uma cultura de permanecer muito tempo junto de outras pessoas e isso ajuda a escapar de distrações da tecnologia.
8) Organize a troca de e-mails: No laboratório farmacêutico Boehringer Ingelheim, passaram a enviar e-mails somente para pessoas envolvidas com o assunto e para resolver assuntos simples. Questões complexas são conversadas pessoalmente ou por telefone. Se um assunto não for resolvido em três mensagens, marca-se uma reunião.
TESTEMUNHO DE UMA JOVEM PAROQUIANA
“Eu passava horas conectada ao Facebook. Tinha o aplicativo no celular e não me desconectava nunca. Muitas vezes acordava de madrugada para acessar, interrompia jantares e conversas com amigos e familiares para poder estar atenta as atualizações que apareciam. Assim que me tornei serva, logo que fui para a Intercessão fiz um “jejum” de Facebook por alguns dias em preparação para um encontro. Percebi que passei a aproveitar melhor o meu tempo, me tornei mais produtiva profissionalmente, comecei a conversar mais com meus amigos pessoalmente ou até mesmo por telefone. Meu namoro amadureceu, pois o Facebook muitas vezes foi motivo de discussão. Faz algumas semanas que optei por excluir o meu perfil e não estou sentindo falta alguma. De certa maneira parece que tirei um peso das costas, pois agora sinto realmente que tenho muito a viver com minha família, amigos e namorado, porem em um mundo real”.
Flávia Stringueta, 22 anos, participante do grupo Dom Bosco Jr.